Belo Monte: Presidência do Ibama concorda que é preciso rever vazão do rio Xingu
Por Arimateia Jr
Publicado em 13/09/2025 09:12
Politica
A Usina Hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu, próximo ao município de Altamira, no norte do estado Pará

O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, acatou as recomendações da Diretoria de Licenciamento do órgão no caso da partilha das águas do rio Xingu pela hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. Agora, a usina vai precisar rever a forma como controla a vazão do rio Xingu. A mudança pode se tornar um ponto de virada para os povos tradicionais da região, que há anos denunciam os impactos da usina e pedem que a hidrelétrica libere mais água.

 

Em um despacho ao qual a reportagem teve acesso, a presidência do Ibama analisou as sugestões apresentadas no final de agosto pela Diretoria de Licenciamento, que, pela primeira vez no processo de renovação da licença de operação da usina, recomendaram a apresentação de um novo hidrograma para a Volta Grande do Xingu – como a Pública noticiou. Agora, a diretoria de licenciamento precisa comunicar a decisão à Norte Energia, que opera Belo Monte. Na sexta-feira, dia 12 de setembro, a diretoria de licenciamento comunicou a decisão à Norte Energia, que opera Belo Monte.

 

A Agência Pública pediu mais detalhes ao Ibama, inclusive, sobre quais as possibilidades a empresa que opera a hidrelétrica, a Norte Energia, tem para negociar essa mudança na vazão. A resposta do órgão será atualizada na reportagem.

 

O hidrograma é um esquema, definido no licenciamento ambiental entre o Estado brasileiro e a Norte Energia, que estipula os volumes de água (as vazões) a serem liberadas mensalmente pela usina para a Volta Grande – trecho de cerca de 130 quilômetros do rio, após a cidade de Altamira, com biodiversidade e riqueza cultural únicas no país.

 

A hidrelétrica de Belo Monte funciona no modelo à fio d’água, o que significa que ela não possui um grande reservatório de acumulação, como outras usinas desse porte, e depende totalmente do fluxo do próprio rio Xingu para gerar energia. Para isso funcionar, a hidrelétrica barrou o rio antes da Volta Grande, desviando em média entre 70% e 80% das águas que antes alimentavam a região. A quantidade de água que sobra para ser liberada para a Volta Grande ficou definida pelo hidrograma.

 

Ao longo dos últimos anos, vários documentos produzidos pela área técnica do Ibama mostram que o esquema atualmente em vigor vem afetando negativamente a reprodução de peixes, a vegetação que antes era inundada pelas águas do rio, além da alimentação, fontes de renda e modo de vida dos povos tradicionais da Volta Grande. Por isso, analistas do órgão já haviam recomendado uma revisão das vazões praticadas, ponto acatado em agosto pela diretoria de licenciamento e, agora, pela presidência do órgão.

 

Por que isso importa?

A vazão do rio Xingu hoje é considerada insuficiente por moradores, que denunciam há anos impactos no seu modo de vida e no ecossistema da região;

A nova decisão da presidência do Ibama pode levar a uma mudança na forma como a hidrelétrica controla as águas do rio.

 

 

O processo de licenciamento ambiental de Belo Monte condicionou a licença de operação do empreendimento a uma série de medidas que precisam ser tomadas pela Norte Energia como contrapartida para o funcionamento da hidrelétrica, a segunda maior do país. Entre elas, está o controle das vazões na Volta Grande de forma a reduzir impactos na qualidade da água, na fauna, flora, pesca, navegação e modos de vida da população local.

 

O hidrograma foi criado para atender essa medida. Hoje, ele é um dos pontos mais sensíveis e críticos do processo de renovação da licença de operação de Belo Monte, vencida desde 2021. Como a Norte Energia solicitou a renovação dentro do prazo estipulado por lei, a usina pode continuar operando mesmo com a licença vencida até a decisão final do Ibama sobre a renovação.

 

Em agosto, a diretoria de licenciamento do Ibama afirmou que depois de quase uma década de operação da hidrelétrica e a realização de vários estudos, ainda não foi possível determinar um esquema de vazões que assegure “a manutenção dos ecossistemas naturais, os modos de vida das comunidades residentes e a compatibilização com a geração de energia”.

 

Com base em análises técnicas e relatórios de vistorias presenciais do Ibama, a diretoria sugeriu que seja dado um prazo de quatro meses para a Norte Energia propor um “novo ciclo de hidrogramas”, que atenda não só as recomendações técnicas do órgão, mas também aquelas feitas pelo Monitoramento Ambiental Territorial Independente (MATI), grupo formado por pesquisadores indígenas, ribeirinhos e da Universidade Federal do Pará, Universidade de São Paulo e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.

 

O MATI conduz, há anos, um monitoramento diário de áreas de reprodução de peixes na região da Volta Grande que, antes da usina, costumavam alagar na época de cheias, formando o ambiente ideal para a reprodução de várias espécies. Com base nesse trabalho, o grupo já propôs um novo hidrograma que prevê mais água para a região na época reprodutiva. No podcast “Xingu em Disputa”, a Pública mergulha no trabalho do MATI e traz as denúncias de indígenas e ribeirinhos sobre o hidrograma (ouça aqui).

 

Além das recomendações ambientais, o Ibama afirma que a reformulação do hidrograma precisa considerar as questões de segurança energética, já que a geração de Belo Monte, especialmente nos meses finais e iniciais de cada ano, é considerada importante pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e pelo Ministério de Minas e Energia.

Fonte: Ag. Pública

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